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Lebre ou tartaruga?

Quem já é de casa deve se lembrar de que nos primeiros encontros do GESEB falamos um pouco sobre gradualismo e equilíbrio pontuado. Dessa vez nós fomos mais a fundo e nos perguntamos: a evolução é rápida, lenta ou depende? Para responder essa pergunta precisamos entender o que são taxas de evolução.

Taxa é a razão entre duas grandezas. Nesse caso, taxa evolutiva seria a relação entre mudanças nas características de uma linhagem por unidade de tempo. Podemos medir uma mudança morfológica simplesmente pela diferença, digamos, métrica entre o formato ancestral e o formato atual. Isso quer dizer que você pode, literalmente, medir características homólogas em membros de um determinado táxon atual e nos membros mais antigos dessa linhagem preservados no registro fóssil, subtrair uma medida da outra e dividir pelo espaço de tempo que separa os dois. Esta distância entre as características não precisa ser somente contínua. Também podemos calcular a taxa evolutiva de características discretas, como alguns comportamentos e a presença ou ausência de determinado traço. Este também é o tipo de métrica que utilizamos para calcular taxas evolutivas de genes, por exemplo.

Uma outra forma de analisar as taxas de evolução entre taxa diferentes é comparar o número de clados novos em um mesmo período de tempo. Por exemplo, sabemos que mamíferos têm uma taxa evolutiva maior que bivalves porque o tempo de “sobrevivência” dos gêneros de mamíferos é menor no registro fóssil, ou seja, os mamíferos se diversificaram mais ao longo da história.

Também são estes cálculos que nos permitem dizer, quantitativamente, se uma espécie é um fóssil vivo ou não. Um fóssil vivo é uma espécie remanescente de um clado já extinto que, em geral, apresenta pouquíssimas mudanças ao longo da história. Quanto menos diferenças entre o registro fóssil e os organismos atuais de uma mesma espécie, mais próxima de zero é a taxa evolutiva, indicando que esta espécie pode ser considerada um “fóssil vivo”.

O "caranguejo" ferradura é considerado um fóssil vivo, pois os fósseis de sua linhagem diferem pouco dos organismos atuais. Fonte: http://goo.gl/HmT2Dg

Eldredge e Gould sugeriram que as taxas evolutivas sempre seguem o mesmo padrão: períodos de baixas taxas evolutivas, onde poucas mudanças nos caracteres ocorriam entre os eventos de especiação, pontuados por súbitos eventos de mudança rápida durante uma especiação. Essa explicação do padrão observado no registro fóssil, a que chamamos “equilíbrio pontuado”, se opõe à ideia de “gradualismo filético”, onde as taxas de evolução se mantêm constantes e os eventos de cladogênese são contínuos. O padrão previsto pelo “equilíbrio pontuado” e o previsto pelo “gradualismo filético” são encontrados no registro fóssil, sendo o primeiro destes mais frequente. Esses dois modelos de evolução são extremos de um contínuo, contendo várias maneiras pela qual a evolução pode proceder, da mais abrupta (equilíbrio pontuado) à mais suave (gradualismo filético).

By Punctuated-equilibrium.svg: Miguel Chavez, modified by wooptooderivative work: Pedro Spoladore (Punctuated-equilibrium.svg) [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3APunctuated-equilibrium-pt.svg">via Wikimedia Commons</a>

Então a evolução é rápida, lenta ou depende? Na verdade, as linhagens podem apresentar taxas de evolução muito variadas ao longo de sua existência. Os mamíferos, por exemplo, aumentaram muito suas taxas de evolução logo após o evento de extinção em massa no limite entre o Cretáceo e o Terciário. Enquanto isso, os peixes pulmonados evoluíram rapidamente há 300 milhões de anos atrás até o período entre 250 e 250 milhões de anos , quando as taxas de evolução desse grupo desaceleraram drasticamente. A resposta para a nossa pergunta é: depende! Ao longo da sua história, diferentes linhagens podem apresentar diferentes taxas evolutivas por vários motivos! O difícil é saber quais!

A “velocidade” da taxa evolutiva depende da escala temporal de observação. Em períodos de tempo curtos, é possível notar mudanças morfológicas, genéticas ou comportamentais significativas e rápidas, capazes de mudar temporaria ou permanentemente o nicho ocupado por uma espécie. No entanto, ao observarmos a história evolutiva da espécie no tempo geológico, a oscilação destas características pode ser mascarada pela mudança “média” e gradual aparente em longos períodos de tempo. Além disso, mesmo uma mudança considerada rápida no registro fóssil pode ter sido gradual se pudéssemos observá-la de perto, principalmente porque a fossilização é um evento muito, muito raro. Uma mudança brusca no pool gênico de uma população pode levar a mudanças graduais de comportamento e, posteriormente, morfologia.

Com isso concluímos que não há dicotomia, polêmica ou contradição: a evolução é tanto gradual como pontual. Gould e Dawkins podem fazer as pazes e Darwin pode parar de se remexer no túmulo.


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